Desde agosto de 2015,
o Ministério da Saúde vem observando um aumento de casos de microcefalia no
Brasil. O último registro, de novembro de 2015, consta de 739 casos em que há
suspeitas da presença da doença em recém-nascidos. No
entanto, ao contrário do que vem sendo divulgado, os casos não podem ainda ser
atribuídos ao zika vírus pela ausência de comprovação científica da relação de
causa e efeito, segundo consta no próprio site do Ministério da Saúde. Em
consequência disso, um debate antigo foi desencadeado e gera preocupação entre
os membros da Igreja Católica, que defende veementemente a vida: há, no Supremo
Tribunal Federal (STF), um projeto com pedido para descriminalizar o aborto em
casos de microcefalia na Constituição Federal.
De acordo com a lei,
o ato é considerado crime contra a vida, e a culpabilidade é extinta apenas em
três casos: quando há risco de vida para a mãe, quando a criança deriva de um
estupro e quando o feto é diagnosticado com anencefalia – ausência parcial ou
total do cérebro. No caso de microcefalia, o debate toma outros rumos e pode-se
levantar até mesmo a questão da eugenia, que consiste em uma seleção para
melhorar características genéticas de gerações futuras.
Para o jurista Paulo Leão, presidente da
União de Juristas Católicos do Rio de Janeiro, o aborto nesse caso seria o
caminho para uma sociedade cada vez mais violenta e desrespeitadora dos
Direitos Humanos.
“Esse pedido está na contramão de princípios
e objetivos fundamentais da República, sem contar que é um ato bárbaro e
contrário à índole do povo brasileiro, que é acolhedor do pequeno, do que
necessita de cuidados”, ponderou.
A
questão por trás da microcefalia
O advogado apontou
que a falta de comprovação da relação da doença com o zika vírus deve ser
levada em consideração antes de tornar esse um problema de responsabilidade do
Estado. Também defendeu que antes de um debate sobre permitir-se ou não o
aborto, é necessário que haja um estudo mais cuidadoso e minucioso para
descobrir a causalidade por trás da doença.
“A anencefalia, por
exemplo, cresceu muito em Cubatão décadas atrás devido às toxinas e produtos
tóxicos que existiam no ar. Feito o controle do meio ambiente, esse número
diminuiu bastante. Deveríamos buscar outras possíveis causas da microcefalia
antes de atribuir ao zika vírus, e isso deve ser feito com mais
responsabilidade”, insistiu ele.
Registros que
sustentam o argumento do legista referem-se à existência do vírus em
praticamente toda a América Latina – mais de 20 países – e de não terem casos
de microcefalia confirmados em gestantes portadoras do vírus.
Na Colômbia, mais de
30 mil casos de zika foram registrados até a primeira semana de fevereiro,
segundo o boletim epidemiológico do Instituto Nacional de Saúde. Dentre eles,
5.013 são em mulheres grávidas, sem existência de nenhuma confirmação de
microcefalia. “Ou seja, existe aqui no Brasil uma mera suposição que está
pendente de evidências científicas sólidas e consistentes”, disse.
Respeito
à vida
O bispo auxiliar da
Arquidiocese do Rio de Janeiro Dom Antonio Augusto Dias Duarte exortou os
católicos a serem homens e mulheres que buscam ter caráter, serem
comprometidos, articulados e bem unidos, a fim de criarem, juntos, uma força
tarefa contra a cultura dominante de morte.
“Deve-se assistir,
como espectador atônito e indignado, as várias iniciativas de ONGs abortistas e
as estratégias de fundações internacionais, que já estão se movimentando a fim
de legitimar juridicamente mais uma permissão do aborto para essas crianças com
microcefalia, cujo diagnóstico só é feito no último trimestre da gravidez?”,
questionou o bispo, que é animador da Pastoral Familiar e defende a vida desde
a sua concepção.
Leão explicou que o
aborto, além de crime contra a vida, é, em casos de microcefalia, uma situação
aberrante. “Porque é um defeito sério, mas que em muitos casos há não só uma
sobrevida bastante significativa, mas uma sobrevida com uma interação grande no
meio social, dependendo, inclusive, de tratamento, de estimulações do cérebro.
Ou seja, tudo aquilo que uma medicina humanitária e solidária, como deve ser a
medicina e serviço de saúde em nosso país, pode oferecer”, pontuou.
Ele afirmou que há
correntes, tanto dentro quanto fora do Brasil, que pretendem excluir o doente
ou o parcialmente incapacitado. No caso da proposta de aborto por microcefalia,
segundo ele, isso se materializa.
“Ou seja, ‘vamos
matar’, dizem eles, ‘aquele que está em gestação e que posteriormente vai
apresentar alguma deficiência que vai exigir maiores cuidados e atenção da
sociedade’. É uma proposta que me parece bastante contrária a todos os
princípios humanitários, a todos os princípios de solidariedade e de uma
verdadeira dignidade da pessoa humana”, sublinhou.
Ao contrário desta
atitude violenta, o jurista acredita que o que deve ser feito, tanto pela
comunidade católica quanto pela sociedade em geral nos casos de mães grávidas
de filhos com microcefalia, é se posicionar de forma a apoiar e acolher com
misericórdia não só essas mães, mas também as crianças.
“O abortamento
provocado nunca é uma solução; sempre gera mais violência. Por maiores que
sejam os problemas decorrentes de uma gravidez indesejada ou mesmo de uma
gravidez desejada que tenha uma criança com anomalias ou patologias, acolher o
ser humano é sempre um gesto de bondade, de verdade e de misericórdia, sejam
quais forem as situações negativas que estejam envolvidas”, defendeu.
Sobre as especulações
de que a ONU estaria incentivando a descriminalização do aborto em países em que
os casos de microcefalia vêm aumentando, ele argumentou que o apoio partiu de
pessoas que possuem cargos na ONU, mas não da entidade em si.
“Alguns ocupantes
temporários de cargos na ONU é que estão fazendo isso. Ela, por seus países,
não aprova o aborto. Já se tentou por muitas vezes aprovar o abortamento em
sedes e representações dos países, e isso muitas vezes foi rejeitado. Na
realidade, são ocupantes temporários, que a meu ver estão exorbitando de sua
competência, querendo falar pelos países que não são por eles representados”, finalizou.
Fonte: Jornal Testemunho de Fé, página 14
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